Nas últimas semanas, alguns relatos de (ex)funcionárias do Uber viralizaram na web. Os relatos falam de assédio sexual, de repetidas tentativas de reportar os assédios ao RH e ao management da empresa, bem como sobre situações onde as funcionárias se sentiram discriminadas por serem mulheres no ambiente de trabalho -também sem qualquer resposta por parte das áreas que receberam as queixas internas. Alguns trechos do principal relato (de uma engenheira da DevOps chamada Suzan Fowler) seguem abaixo:

"On my first official day rotating on the team, my new manager sent me a string of messages over company chat …It was clear that he was trying to get me to have sex with him, and it was so clearly out of line that I immediately took screenshots of these chat messages and reported him to HR. Upper management told me that he “was a high performer”… and they wouldn’t feel comfortable punishing him for what was probably just an innocent mistake on his part."

A Uber, através do seu CEO Travis Kalanick, respondeu rapidamente ao artigo, alistando um exército de pesos-pesados para conduzir uma investigação sobre os relatos de Fowler. Mas muito do estrago já tinha sido feito à marca empregadora da empresa, que têm sido protagonista frequente de protestos, relatos e manifestações na web. O post de Fowler ressuscitou ainda a hashtag #DeleteUber, ou que encoraja deletar o aplicativo do seu celular, que tinha aparecido semanas antes relacionada à posição da empresa em relação aos protestos ao banimento de muçulmanos dos EUA.

Além dos assuntos relacionados às questões de gênero e assédio, o artigo relata um caos gerencial impensável para uma empresa do sucesso da Uber, o que nos leva a questionar um pouco mais se a grama do vizinho é realmente mais verde que a nossa: Fowler fala sobre prioridades que mudam de maneira desgovernada, pressões e negociações políticas tóxicas e outros exemplos de falta de gestão.

Nesse artigo vamos resumir algumas lições que você e sua empresa podem tirar desse triste nó de acontecimentos. Se você está pouco informado sobre o assunto, leia o relato de Fowler, e volte pra cá quando tiver feito isso :)

  1. Cuidado com o que se passa na empresa é cada vez mais essencial - um episódio como esse, que denota aspectos importantes da cultura de uma empresa, podem dar uma guinada difícil de ser desfeita na marca sua empregadora, o que muda estruturalmente a sua capacidade de atrair e reter talentos e o tipo de talento que sua empresa atrai. Com aplicações como Glassdoor e Love Mondays “esconder” o que se passa dentro da empresa vai ficando cada vez mais difícil - portanto sua empresa tem que realmente viver os valores que comunica ao mundo, principalmente aos talentos;
  2. Tenha diretrizes muito claras de como a empresa deve ser comportar em assuntos delicados como os reportados por Fowler. Ainda que a decisão da sua empresa seja por defender os “top performers” mesmo que estes tomem atitudes dúbias (somos fortemente contra esse tipo de atitude e ainda mais contra empresas que os aceitam), essa decisão tem que ser consciente de suas consequências, que invariavelmente virão;
  3. Treine seus gestores e o RH sobre como lidar com situações como essa. Fowler dá diversos exemplos (e para comprová-los tem documentação extensa, como emails, screenshots e gravações) de como seus gestores e o RH do Uber sumariamente ignoravam suas reclamações, ou acobertavam abertamente as atitudes dos infratores (um chegou a dizer a ela que ela seria prejudicada na sua próxima avaliação de desempenho caso reportasse seu gestor, e que nada podia ser feito a respeito);
  4. Seja intolerante com assédio sexual, um crime passível de pena pela Lei. Fowler relata que no primeiro dia de trabalho com um novo gestor sofreu assédio de um infrator reincidente e, ao reclamar sobre isso com o RH, recebeu explicações mentirosas de que o infrator era “réu primário” na empresa, o que ela descobriu ser mentira ao falar com outras ex-funcionárias do assediador, mostrando complacência da empresa com as atitudes supostamente criminosas desse gestor.

Sua marca empregadora é e será um subproduto do que é praticado no dia a dia da sua empresa: já se foram os dias em que marketing e outras ferramentas conseguiam "pintar" uma marca a despeito da realidade. Hoje em dia, nenhuma empresa ou marca sobrevive sem uma fundação sólida de respeito e igualdade de gêneros. A marca empregadora deve ser apenas um reflexo dessa fundação.