Um dos aspectos mais sensíveis na gestão de pessoas é o processo de avaliação e de tomada de decisão. Podemos dizer que esses dois processos estão no centro da gestão de pessoas pois atuam como articuladores das políticas e das práticas de gestão de pessoas.

Por isso apresento a seguir uma série de artigos sobre o tema em uma sequência que permita a compreensão desses processos e de sua importância crítica. Esses artigos terão os seguintes temas:

  • Avaliação intuitiva ou natural das pessoas nas organizações: avaliação de desempenho
  • Relação entre o desenvolvimento do processo de avaliação e o desenvolvimento da gestão de pessoas.
  • Avaliação de potencial e indicações para o processo sucessório
  • Processos de decisão sobre as pessoas
  • Feedback x diálogo de desenvolvimento.

A seguir apresentamos o primeiro artigo tratando da avaliação intuitiva de pessoas, conhecida como avaliação de desempenho.

Avaliação Intuitiva

Em nossas pesquisas sobre avaliação percebemos que os gestores tomam decisões sobre os membros de sua equipe utilizando um conjunto de critérios que são constantes, ou seja, valem-se desses critérios para olhar para todos os membros da equipe de forma equânime, procurando um padrão de justiça e para não se deixarem levar por preferências pessoais. Esses padrões estão presentes mesmo que a organização não tenha um sistema estruturado de avaliação.

Por essa razão, observamos que quando as organizações estruturam seus processos de avaliação utilizam os critérios que são comuns a maioria dos gestores.

Esses critérios fazem parte de uma mesma categoria para os gestores, mas ao analisá-los pudemos agrupá-los nas seguintes categorias: desenvolvimento, resultados e comportamentos.  Essas categorias de critérios são normalmente chamadas pelas organizações brasileiras de avaliação de desempenho. Percebemos que que uma pessoa é valorizada somente se for boa em todas as três categorias de critérios.

Avaliação do Desenvolvimento

O desenvolvimento é caracterizado quando a pessoa assume atribuições e responsabilidades de maior complexidade. O nível de desenvolvimento gera no líder a sua expectativa de desempenho em relação ao seu liderado. Vamos analisar a seguinte situação o líder tem dois liderados com o mesmo salário e mesmo cargo, mas ao apertar o acelerador de um deles este vai de 0 a 100km por hora em 5 segundos enquanto ao apertar o acelerador do outro vai a 60 km por hora se o líder rezar com fervor. Naturalmente, esse líder irá oferecer ao primeiro um desafio mais exigente do que para o segundo.

Vejam que o que define a expectativa de desempenho não é o cargo, funções e nem o salário, mas sim, a capacidade de trabalho e resposta da pessoa. Por essa razão o nível de desenvolvimento da pessoa é uma informação valiosa na gestão de pessoas.

Associamos o desenvolvimento de uma pessoa ao nível de complexidade de suas atribuições e responsabilidades. A pessoa só consegue assumir maiores níveis de complexidade na medida em que aumenta o seu nível de compreensão sobre as demandas do contexto sobre ela. Esses dois processos acontecem de forma concomitante, na medida em que a pessoa é desafiada a lidar com maior complexidade, ela tem êxito na medida em que se esforça para compreender melhor a demanda do contexto sobre ela. Ao fazê-lo ela se habilita a lidar com maior complexidade.

Por essa razão está atrelado diretamente ao nível de desenvolvimento da pessoa a remuneração fixa. Historicamente a remuneração fixa sempre foi atrelada ao desenvolvimento, porque representa o elemento mais estável do trabalho entregue pela pessoa. Isso porque, na medida em que a pessoa amplia a sua percepção da demanda do contexto sobre ela, incorpora ao seu patrimônio pessoal e ninguém vai tirar isso dela.

Portanto, não há como pensarmos que uma pessoa que passou a lidar com um nível maior de complexidade vá perder essa capacidade. Não há como pensarmos que uma pessoa que se desenvolveu vá retroagir 

Avaliação de Resultado

O resultado é entendido como o atendimento de objetivos ou metas estabelecidas pela liderança ou pela organização. A expectativa de resultado pode ser atendida de duas formas: através do esforço ou através do desenvolvimento. Vamos supor que tenhamos duas pessoas que produzem 100 e queremos que produzam 120 no próximo mês, o esforçado irá trabalhar duas horas a mais por dia e entregará 120, enquanto a pessoa que se desenvolve aprimorará seu processo de trabalho e dentro da jornada de trabalho normal entregará 120.

Nossa preferência é naturalmente pelo resultado oriundo do desenvolvimento, nossa liderança, entretanto, prefere estimular o esforço. Essa preferência decorre de dois fatos: o primeiro é que estimular o esforço significa pedir que a pessoa faça mais com menos do mesmo jeito, enquanto estimular o desenvolvimento significa pedir que a pessoa faça mais com menos de um jeito diferente. O segundo é acompanhar o esforço significar trabalhar com o concreto enquanto acompanhar o desenvolvimento significa trabalhar com o abstrato. A inexistência de um sistema estruturado de avaliação induz muitos líderes a valorizarem os esforçados em detrimento dos que se desenvolvem.

Avaliação de Comportamento

O comportamento: é composto pelo nível de adesão aos valores da organização, pelo relacionamento interpessoal e pelas atitudes diante do trabalho. A dimensão do comportamento é subjetiva por traduzir sempre a percepção de uma pessoa sobre outra. Mesmo utilizando comportamentos observáveis como parâmetros para avaliação da pessoa nesta dimensão, sempre traduzirão uma percepção particular. 

Por essa razão, algumas empresas utilizam a avaliação por múltiplas fontes, chamada de avaliação 360 graus. Essa dimensão da avaliação é crítica na maior parte das organizações, em sua maioria penaliza severamente as pessoas que desviam dos comportamentos esperados. Nas empresas privadas as pessoas são demitidas e nas empresas públicas são enviadas para a Sibéria organizacional.

Aspectos ritualísticos da avaliação de pessoas

A avaliação de pessoas nas organizações é inerente à relação entre as pessoas e a organização, este capítulo procura trabalhar a avaliação estruturada, ou seja, a avaliação realizada a partir de parâmetros determinados pelo consenso entre líderes do que deve ser valorizado nas pessoas em uma determinada organização. A avaliação estruturada tem sido considerada como essencial para uma gestão de pessoas alinhada com as exigências de um ambiente mais competitivo.

Nesse ambiente competitivo há uma percepção mais clara da importância da gestão de pessoas nos resultados e na produtividade da organização. Essa percepção emerge no Brasil o momento em que nos inserimos em um ambiente mais competitivo com a abertura econômica dos anos noventa. Inicialmente, as empresas privadas percebem essa importância e, já no final da década de noventa, as empresas públicas começam a perceber essa necessidade.

Atualmente, observa-se a importância da avaliação de pessoas em dois aspectos essenciais. O primeiro é o fato de a avaliação estruturada oferecer bases concretas para decisões gerenciais sobre as pessoas, tais como: movimentação, remuneração, desenvolvimento, carreira, processo sucessório e estratégias de retenção. Nesse aspecto a avaliação é o elemento dinâmico na gestão de pessoas, a partir dela são originadas as demais ações.

O segundo aspecto essencial é o fato da avaliação representar um dos poucos rituais dentro da gestão de pessoas. Quando queremos transformar a cultura organizacional um aspecto crítico é a criação de rituais. Na gestão de pessoas a avaliação é um ritual por excelência, por isso, a cada ciclo é necessário efetuar revisões em relação aos critérios e ao processo utilizados. A maturidade do processo de avaliação é um indicador importante do grau de maturidade da gestão de pessoas da organização.

Relação entre avaliação e o amadurecimento da gestão de pessoas

Esse segundo aspecto essencial da avaliação tem embasado as nossas pesquisas nos últimos anos e constatamos que há uma intima relação entre a evolução da avaliação e da gestão de pessoas, por essa razão procuramos compreender e tentar delimitar quais são as fases típicas de evolução de um processo de avaliação de pessoas e sua relação com o amadurecimento da gestão de pessoas como um todo.

Ao longo dos anos 90 e 2000 observamos o nascimento e amadurecimento de muitos processos de avaliação, bem como o nascimento e morte. Foi possível verificar etapas típicas e os motivos para a vida ou morte dos processos de avaliação.

Etapa 1 – os gestores formam um pacto para que todos utilizem o mesmo conjunto de critérios para avaliar e valoriza os membros de suas equipes. Desse modo, cria-se foco de todos no que é essencial em termos de aspectos não tangíveis a serem cobrados das pessoas. A algumas organizações chamam esses aspectos não tangíveis de competências, outras de comportamentos e outras de valores. A construção do pacto é algo relativamente simples porque a maior parte dos gestores já possuem critérios pessoais para conduzir decisões e orientar o trabalho dos membros de suas equipes e geralmente boa parte deles são coincidentes.

Etapa 2 – os critérios pactuados são ritualizados, ou seja, passam a ser utilizados de forma regular em períodos previamente estabelecidos por todos, normalmente materializam-se através de formulários e de um conjunto de procedimentos.  Algumas organizações já iniciam o processo pela etapa 2.

Etapa 3 – quando os gestores passam a avaliar as pessoas usando uma mesma régua percebem rapidamente que, embora a régua seja a mesma, cada um usa-a de um jeito diferente. Nesta etapa é comum surgirem os grupos de calibragem com o objetivo de criar um consenso sobre o uso da régua e criar critérios mais equânimes.

Este é o momento crítico para o processo de avaliação, caso não passe para a etapa 4 morrerá ou poderá virar um mero ritual burocrático sem efeito algum na gestão de pessoas.

Etapa 4 – a avaliação se desdobra em duas avaliações. É interessante notar que algumas organizações pesquisadas não tinham consciência disso, embora praticassem. Na medida em que os processos de avaliação amadurecem caminham para serem realizados em duas instâncias. A primeira instância é a avaliação efetuada entre líder e liderado.

Nessa primeira instância a avaliação é efetuada a partir de parâmetros previamente estabelecidos, contratados entre líder e liderado ou definidos pela organização, seu uso é unicamente dedicado ao desenvolvimento da pessoa avaliada, desse modo, mesmo que no processo de auto avaliação e avaliação do líder haja divergência, a avaliação será facilmente conciliada porque seu objetivo exclusivo é o desenvolvimento da pessoa avaliada. A segunda instância é a avaliação efetuada para definir remuneração, promoção, movimentações ou promoções.

Na quase totalidade das organizações nunca haverá dinheiro suficiente para aumentarmos o salário de todos os que merecem e nem para promover todos os que têm condições. As avaliações nesta instância não são mais comparações de pessoas contra parâmetros, mas sim de pessoas contra pessoas.

Na primeira instância tínhamos uma avaliação absoluta, na segunda instância temos uma avaliação relativa, onde os parâmetros utilizados na primeira instância são uma base para decisões, mas são necessários parâmetros adicionais. Normalmente, as avaliações na segunda instância são efetuadas em colegiados, ou seja, não é o líder avaliando seu liderado, mas um conjunto formado, na maior parte das empresas pesquisadas, pelo líder, seus pares e sua chefia.

Pôde-se observar que os sistemas de avaliação mais maduros caminham para as duas instâncias. Como a avaliação em colegiado estimula uma reflexão continuada sobre parâmetros para valorização e diferenciação das pessoas na organização, há, como resultado natural, um aprimoramento contínuo das políticas e práticas de gestão de pessoas e um aprimoramento do líder como gestor de pessoas. Normalmente na segunda instância as decisões sobre as pessoas consideram seu desenvolvimento, resultados e comportamento ao longo do tempo e não somente no último ano.

Nesta etapa as decisões em colegiado são reduzidas a questões salariais ou de promoção e a implantação é imediata após as reuniões dos colegiados.

Etapa 5 – a avaliação colegiada passa por processos mais sofisticados de discussão os gestores percebem que quando o conjunto de gestores passa a observar as pessoas com maior argucia questões como preparação de sucessores e retenção de pessoas críticas para a organização passam a ser discussões prioritárias e que muitas vezes têm impactos na alocação de recursos para desenvolvimento, remuneração e promoções.

Nesta etapa, entretanto, essas discussões em colegiado nem sempre se tornam realidade porque a organização não está madura para criar mecanismos para acompanhar e fazer realizar as decisões ou discussões realizadas nos colegiados.

Etapa 6 – nesta etapa a organização está mais madura e as decisões do colegiado são mais densas, normalmente o conjunto de critérios utilizados para avaliar as pessoas já é mais reduzido porque existe uma cultura consolidada de gestão de pessoas. Nesta etapa as decisões dos colegiados passam a integrar a agenda dos gestores que controlam as ações e resultados acordados. Nesta etapa há uma mudança de papeis entre gestores e profissionais da área de gestão de pessoas.

Etapa 7 – a avaliação já está no sangue nesta etapa, ela é realizada de forma natural e automática, está tão natural que a rigor nem seria necessário um processo formal, pois faz parte da cultura de gestão. Passa a ser tão natural como respirar.

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