Problemas são desafios de negócio: não só "pepinos" ou "incêndios" que temos que resolver (e apagar), mas também desafios intelectuais, metas a serem batidas ou até o comportamento de times e seus membros. No entanto, por mais que os problemas sejam a essência da gestão (Vicente Falconi diz que "administrar é resolver problemas"), nem sempre estamos bem equipados para solucioná-los.

Como raciocinamos

Para entender a dificuldade em administrar problemas é importante entender como tomamos decisões no trabalho e na vida. Para o economista comportamental Daniel Kahneman, premiado autor de Thinking: Fast and Slow, seres humanos pensam de duas formas distintas:

  • Raciocínio "réptil", ou rápido;
  • Raciocínio "humano", ou devagar.

O raciocínio rápido é aquele instintivo, que desenvolvemos através dos milhões de anos de nossa evolução: o que nos permite, de maneira extremamente rápida, concluir que um barulho específico representa um leão à espreita, e que por isso temos que correr muito para evitar sermos devorados por ele. Esse comportamento foi reforçado através de anos de seleção natural: obviamente, quem possuia esse instinto tinha chances muito maiores de sobreviver aos perigos da vida "selvagem".

Para ilustrar como ele funciona em um contexto contemporâneo-urbano, Kahneman cita um exemplo básico de conhecimentos gerais: quando alguém pergunta "qual é a capital da França," quase sempre a pessoa sabe que a resposta é Paris. Essa intuição é imediata, mas existe pois foi construída a base de experiências passadas. A velocidade em que o indivíduo responde à pergunta é consequência de anos de repetição, demonstrando a capacidade do cérebro de assimilar memórias e reagir de acordo com a necessidade.

Esses instintos se expandiram em outros raciocínios mais complexos mas não menos automáticos, como padrões (pelos e latido são sinais de um cachorro), experiência (fogo queima e queimadura dói) e vieses cognitivos (se eu tive um fim de ano ruim, acabo pensando que o ano todo foi ruim), que são muito úteis no nosso dia-a-dia, mas atrapalham nossa vida quando precisamos resolver problemas mais complexos. É aí que precisamos utilizar o raciocínio 'humano'.

O raciocínio devagar é aquele mais abstrato, deliberado e característico dos seres humanos, identificado pela "frente" do cérebro: seu córtex frontal. É mais abstrato e requer bem mais tempo de "processamento", sendo embasado pela racionalidade e pela reflexão. Usamos o segundo sistema quando precisamos resolver uma questão matemática complexa ou quando estamos lendo um texto com ideias de difícil compreensão.

Resolvendo problemas com os cinco porquês

Os cinco porquês são uma técnica antiga e potente de resolução de problemas. Muitas vezes, quando nos postamos a resolver um problema (principalmente aqueles em que estamos tentando definir a causa de um sintoma), chegamos muito rápido a uma resposta, mas essa resposta nem sempre é a resposta correta do problema.

Aplicar os cinco porquês consiste em ir mais a fundo no problema até que se ache a causa-raíz dele (i.e., do problema a ser resolvido). É como achar a causa da causa da causa, já que todo sintoma tem uma causa.

Vendo problemas com outros olhos (reframing)

Outra forma de resolver problemas é o desgastado, mas não menos potente, "pensar fora da caixa". Vamos pensar em um problema hipotético: Supomos que no seu escritório o elevador esteja muito devagar e todos estão reclamando que a espera por ele é longa demais.

A solução imediata, baseada na sua intuição, seria atualizar o motor do elevador, trocar o elevador, instalar outro, etc. Isso tudo pode solucionar o problema.

Mas se ao invés de recorrer ao óbvio você mudar o ângulo pelo qual enxerga o problema, outras soluções mais atrativas podem surgir. Imagine que, acidentalmente, um espelho é instalado ao lado do elevador e que, aparentemente por mágica, as reclamações caem drasticamente… Você pode acabar descobrindo que atacando o tédio associado à espera, e não a espera per se, resolveria o problema de maneira mais rápida, barata e fácil.

Não que trocar o elevador fosse errado: a solução provavelmente teria funcionado; certamente a espera teria diminuído e as pessoas provavelmente reclamariam menos. Mas ao reformular a maneira em que o problema é encarado, você passa a compreendê-lo de uma forma completamente diferente e a considerar soluções que antes não considerava.

A princípio, a intuição pode tomar conta e levar você a tomar decisões que muitas vezes podem ser sub-ótimas. Ao parar e olhar o problema de outros ângulos, a racionalidade toma conta e você passa a ter uma visão mais ampla da situação. Portanto, formular o problema de uma maneira diferente pode instigar a entrega de melhorias radicais e gerar soluções inéditas e inovadoras.

Invertendo problemas

“Many hard problems are best solved when they are addressed backward.” - Charlie Munger[1]

Inverter problemas é uma forma muito útil e poderosa de resolvê-los. Se estou querendo resolver o problema dos elevadores, posso inverter o problema e tentar resolver "como fazer a situação dos elevadores piorar ainda mais? Como fazer os elevadores ficarem muito lentos, a ponto de praticamente não servirem as pessoas?"

Quando invertemos o problema, podemos ter uma ajuda: as alavancas, variáveis ou fatores que influenciam seu resultado podem saltar aos seus olhos de maneira muito mais fácil e imediata. (Claro, a utilidade da inversão varia de problema para problema).

Outra forma de usar a inversão é pensar, para um dado desafio, o que você teria que fazer para que esse problema piorasse, ou para que ele não conseguisse ser resolvido? Uma técnica análoga é a técnica do pre-mortem: ao começo de um projeto, tente, você e sua equipe de trabalho, visualizar o que significaria sucesso para esse projeto. Em seguida, divida o grupo em dois, e peça para que cada sub-grupo se imagine no futuro, ao fim do projeto, e defenda, respectivamente, por que o projeto foi um sucesso (um sub-grupo) ou um fracasso (outro sub-grupo). É uma forma de incorporar a inversão no processo de trabalho.

Facilitando a resolução de problemas em equipe

Dinâmicas em equipe podem ser muito potentes para a resolução de problemas. Técnicas como retrospectivas, brainstormings e até o design thinking podem ajudar muito no processo. Mas não é fácil criar o ambiente correto para a discussão. Vamos a algumas dicas práticas de como você e sua empresa podem resolver problemas de maneira mais efetiva e criativa em grupo:

  1. Estabeleça legitimidade: Antes de sair falando o que deve ser feito para reavaliar os problemas, crie a segurança necessária para promover essa mudança - conte, por exemplo, uma anedota como a que oferecemos acima, que ilustra a sutileza da reformulação do problema e assim convença os seus funcionários a pensarem com lógica e reflexão ao invés de apenas intuição.
  2. Promova a diversidade: Experts são sempre grandes contribuidores aos nossos problemas, mas pessoas de fora, sem vieses e cacoetes, podem trazer perspectivas novas que multipliquem a criatividade do time. As pessoas de fora servem o propósito de estimular a equipe a pensar diferente. Também é crucial escolher alguém que se sinta confortável em falar abertamente e sem restrições: o menos inibido por estruturas essa pessoa for, mais ela estará propensa para sugerir ideias inovadoras.
  3. Defina bem o problema: Tenha certeza de que todos entendem plenamente qual o problema a ser resolvido. Uma dinâmica interessante é pedir a todos que escrevam em uma folha de papel qual é o problema a ser resolvido. Uma leitura dos resultados mostrará, muito provavelmente, como são diversas as opiniões e os entendimentos. Use esse processo para refinar a percepção do grupo.
  4. Considere as diferentes categorias: Entenda que tipo de problema a organização está encontrando. Não designe suas reflexões apenas à área em pauta - reflita também sobre os diferentes componentes entrelaçados no processo e como eles podem ser pertinentes à compreensão da situação.
  5. Analise exceções: Olhe para instâncias nas quais o problema não ocorreu (ou ocorreu muito) e avalie o que era comum e diferente às situações. Questione os membros envolvidos e tente alcançar alguma conclusão do que é que estava funcionando e como repetir (ou mudar) a fórmula.
  6. Conduza boas discussões: É importante gerir as emoções dos funcionários e fazer com que ninguém sinta-se pessoalmente atacado. Tente manter uma dinâmica de crítica construtiva a todo momento, desassociando o lado pessoal dos funcionários e focando apenas na construtividade.
  7. Questione o objetivo: Entenda o objetivo de cada um dos solucionadores de problemas e desafie suas perspectivas. Entenda detalhadamente porque a equipe está abordando o problema atual e tente entender a cognição de cada membro envolvido. Busque compreender como eles enxergam a materialização da solução e quais podem ser as limitações de cada perspectiva. Entender melhor as ideias de cada funcionário permitirá que você entenda mais a profundo a motivação de cada proposta. Com isso, você poderá entender melhor porque as pessoas estão sugerindo o que elas estão sugerindo.

Resolver problemas em equipe pode ser um trabalho penoso e requer muita prática. Ao trabalhar mais com esse processo, continue encorajando a sua equipe a confiar nele - esteja preparado, pois vão haver momentos de confusão. O método em si pode ajudar, mas é a prática das soluções que vão ajudar você a entender o que funcionou ou não. Um casamento saudável da teoria com a prática é o que produzirá os melhores resultados, sempre refletindo muito antes de agir, priorizando a racionalidade ao invés da intuição imediata do momento.

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[1] Sócio de Warren Buffet

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